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O pássaro na chuva

  • Foto do escritor: Rangel G. Godinho
    Rangel G. Godinho
  • 15 de set. de 2024
  • 2 min de leitura

Atualizado: 17 de set. de 2024

Em uma manhã de verão de 2024, sentado em duas almofadas confortáveis no chão da Capela São José de Anchieta no Mosteiro de Itaici, eu tinha a minha frente o sacrário e uma grande janela que estava a cerca de um metro ao lado do sacrário.


Na capela haviam cinco janelas no mesmo padrão, vidros transparentes e vidros verdes. As janelas estavam veladas por longas cortinas verdes, um tom verde escuro muito belo. Além de mim, outras três pessoas também estavam ali vivendo seu momento de contemplação da Palavra e da vida, eram três mulheres, sendo duas freiras e outra senhora casada.


Chovia nessa manhã, uma chuva volumosa, ao mesmo tempo branda, com raios e trovões que marcavam presença, mas não assustavam. Estava frio, um frio suave que não exigia casaco para se sustentar perante a brisa que entrava pelas grandes janelas abertas. A brisa era tão serena que quase não balançavam as cortinas; embora, algumas vezes balançassem com mais vigor as árvores enormes que estavam do lado de fora. A intensidade dos movimentos dentro e fora da Capela eram diferentes.


A Capela situava-se no segundo andar do Mosteiro, as copas das árvores ultrapassavam a altura de toda a edificação, claro havia diferença estratigráfica da vegetação, formavam um conjunto harmonioso de beleza paisagística e proteção contra ventos mais fortes.


Do lugar onde eu estava sentado, olhei através da grande janela e vi dois pequenos pássaros pousados sob a chuva e o vento em um galho desfolhado e estreito. Logo, um dos pássaros voou, o outro permaneceu. A intensidade da chuva e dos ventos variavam, o galho balançava junto com a árvore e o pássaro parecia seguir a dança. Pensei, porque ele não busca se esconder da chuva? Porque não se protege contra o vento? Ou mesmo, porque não se apoiar em um galho mais grosso e resistente?


Nada disso, ele permanecia ali dançando o baile da natureza. O pássaro estava em equilíbrio com os movimentos da vida, reconhecia o quanto poderia suportar de volume de água ou força do vento. Dentro de si há limites e potencialidades reconhecidas que lhe dão segurança para a audácia de escolher um lugar para sentir sua conexão com toda criação, unindo movimentos externos e internos numa harmonia desconcertante ao meu olhar que me convidava e enfrentar as monções que também me transpassam.


O pássaro estava contemplando e saboreando a chuva, parecia desfrutar de cada ritmo que o vento empunhava ao galho. Acredito que de onde ele estava, tinha uma visão ampla e desafiadora, conectava a terra e o céu com o olhar e me fazia experimentar também essa liberdade interior ao observar a cena.


Quando a chuva se acalmou ao extremo e o vento já não balançava o galho, o pássaro voou e eu fui com ele para ver onde juntos iríamos pousar.

Rangel Gomes Godinho

28 de janeiro de 2024

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© 2020 por Rangel Gomes Godinho.

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